Inês foi morta, Camila coroada Por Elaine dos Santos




                                                         Inês foi morta, Camila foi coroada


                                                                                                                           Elaine dos Santos


Enquanto assistia à coroação do rei Charles III, eu pensava nas voltas que o mundo dá. Ele não seria rei se o seu tio avô não tivesse aberto mão das suas obrigações reais para casar-se com uma plebeia divorciada em meados do século XX. No entanto, como eu – e mais um milhão de pessoas – havia visto o seu casamento em 1981 com Lady Diana Spencer e, depois disso, acompanhado toda a celeuma real (e mundana) decorrente daquela união conjugal, Camila era a intrusa – a amante que, segundo a mídia, foi responsável pelo fim do casamento do príncipe feio com a princesa encantada.

Em “Os Lusíadas”, a grande epopeia do povo português, Luís Vaz de Camões, pela voz do narrador, mas, em grande parte, pela voz de Vasco da Gama, conta fatos relevantes da História de Portugal ao rei de Melinde (nas Índias) e um dos episódios mais conhecidos diz respeito à coroação de Inês de Castro, aquela que foi rainha depois de morta.

Inês era dama de companhia de Dona Constança, mulher de Dom Pedro, que era filho do rei português Dom Afonso IV de Borgonha. Apesar disso, Inês de Castro tinha sangue nobre, embora fosse filha ilegítima justamente de um nobre português.

Quando Dona Constança faleceu, Inês retirou-se para Coimbra, às margens do rio Mondego e, por sua vez, Dom Pedro, futuro rei português, agora viúvo, pretendia casar-se com ela e, no futuro, torná-la rainha. Ciente das intenções do filho, o rei D. Afonso determinou, em 1355, o assassinato de Inês e de seus filhos, para que não restassem futuros postulantes ao reino de Portugal.

Em 1361, portanto seis anos depois da morte dela, quando já era rei, Dom Pedro mandou transladar os restos mortais de Inês com pompas de rainha para o mosteiro de Alcobaça. Decidido a imortalizar o seu amor por Inês, Dom Pedro jurou diante da Corte que se casara com ela, clandestinamente, antes do assassinato a mando de seu pai, o que a transformava em rainha, mesmo após a sua morte. O novo rei mandou coroá-la depois de morta.

Em casa, sozinha, eu ri durante a coroação de Charles III. Ocorreu-me que ele poderia estar se vingando da Monarquia britânica – que pensamento maldoso! -, que lhe impediu de viver com a sua amante Camila, o fez casar-se com Diana e, ao que parece, no fim da história, Camila foi coroada rainha.

Biografia

Elaine dos Santos

De Restinga Seca/RS. Filha de Mario Cardoso dos Santos e Vilda Kilian dos Santos (in memoriam). Graduada em Letras, Mestre e Doutora em Estudos Literários, pela Universidade Federal de Santa Maria (UFSM). Possui formação em língua espanhola pela Universidad de La Republica, Montevidéu. Possui sete livros publicados como autora ou coautora. É revisora de textos acadêmicos. Cronista, com publicações em diversas antologias. Membro da ALAAG.


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