Cachorrinho Por Flávia Werneck




Conto inspirado na música: Cachorrinho - Ferrugem


Pedro estava terminando de arrumar os copos quando o celular tocou.

Enquanto Patrícia desmarcava ao telefone o encontro, ele olhava para a mesa. Com tudo a postos: pratos, talheres, copos, descansos para as panelas, velas e a caixinha de veludo, na ponta da mesa, que ele pretendia esconder na gaveta perto do fogão para pegar de surpresa quando fosse buscar a lasanha.

Tinha levado o dia todo cuidando do pedido e preparando a surpresa com muito carinho e amor. Até se arriscou a fazer ele mesmo a lasanha, pois sabia que era o prato preferido da namorada.

Mas a ligação mudou tudo.

Patrícia tinha simplesmente desmarcado para encontrar as amigas no shopping, querendo relembrar os tempos de escola e esquecer os desafios da vida. Por algumas estarem de passagem pela cidade, ela achou que era motivo suficiente para fazer essa mudança repentina de planos.

E o pior? Ela nem parecia minimamente chateada, estava completamente empolgada e agitada com aquilo tudo.

Pedro sentou, frustrado, enquanto refletia sobre a vida que estava levando e o rumo do relacionamento deles. Era difícil vislumbrar um futuro promissor quando eles pareciam estar em momentos tão diferentes.

A cada dia ele percebia que seus olhares e pensamentos tomavam rumos distintos…

Ele queria assentar e planejar aquele cotidiano simples e tranquilo que vai sendo desejado com o amadurecimento; ela parecia buscar a agitação do início da vida adulta e reviver aqueles anos incoerentes e sem rumo do início da faculdade.

Billy entrou na cozinha abanando o rabo e Pedro se ajoelhou para fazer carinho no seu maior companheiro de vida.

Cachorros sempre o empolgaram, mas Billy foi o primeiro que realmente conquistou um lugar especial em seu coração. Pela primeira vez, ele se sentia um pai; o que poderia soar estranho para as outras pessoas, mas algo totalmente compreensível para qualquer pai (ou mãe) de pet.

Olhando para os olhos caramelos, ele novamente lembrou de Patrícia e a confusão só aumentou em sua mente.

Será que aquela ligação teria sido um sinal de que a vida deles estava desconectada de vez?

Resignado, ligou o forno, colocou a lasanha e esperou que ela ficasse pronta enquanto deslizava o feed do Instagram e via as “novidades” da vida dos seus amigos.

Quanta gente adora ficar postando tudo de “incrível” que tem na vida, não é? Mas ele sabia bem o quanto aquelas fotos espetaculares eram rasas e representavam muito pouco do que cada um vivia diariamente.

O forno apitou ao mesmo tempo em que ele abria o novo story da Patrícia, que já estava no shopping às gargalhadas com as três amigas enquanto brindavam com cerveja e uma pizza sobre a mesa.

Fechou o aplicativo, chamou Billy e foi retirar a travessa do forno.

Retirou duas porções da delícia italiana, colocou uma para o cachorro e comeu olhando para a caixinha de veludo, que voltaria para a gaveta do guarda-roupa (e talvez não saísse mais de lá).

O latido animado foi o único motivo que o fez sorrir depois.

Flávia Werneck



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